Passando a limpo o mundo das imagens

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Fractais e neurônos são lindos, mas são arte?

O Instituto Cervantes, em São Paulo, abriu hoje uma mostra chamada "Paisagens Neuronais", obtidas a partir de pesquisas das neurociências. Essas imagens são certamente úteis mas, para nós, são apenas belas. As notícias sobre a exposição estão por aí, não é preciso comentar... Mas lembrei de exposições que vi nos anos 90, da então chamada "arte-fractal".

Acho que todo mundo sabe o que é fractal, não? Pelo menos, todo mundo já viu alguns por aí, e sabe que são imagens impressionantes. Em princípio, elas não foram feitas pra serem bonitas ou feias, elas são representações constituídas a partir de uma nova concepção de geometria. Aprendemos na escola a geometria euclidiana, aquela que nos ensinava que o ponto não tem dimensão, a reta tem dimensão 1, o plano, 2, e o sólido, 3. Já a geometria fractal concebe objetos com dimensão fracionada (daí o nome fractal), algo como 2,38. Como assim?! Mais do que isso, vou ficar devendo. Minha mente foi definitivamente formatada por Euclides. Mas os fractais parecem representar melhor a nossa natureza, que é um tanto mais complexa, um tanto mais caótica do que aquele empilhamento de cubos, piramides, cones, toróides das aulas de geometria da escola. Estão ligadas à revolução das novas (já nem tanto) ciências do caos. 

(Amanhã postarei o link para download de um software muito legal para geração de fractais.)

Enfim, fractais também são representações científicas, mas que chegaram até nós, pessoas comuns, como objetos de contemplação estética, da mesma forma que os diagramas de chip de computador, os registros feitos por sondas espaciais, as fotografias microscópicas e, agora, as paisagens neuronais.

Essas imagens são certamente belas, mas isso é suficiente para dizer que são arte? Também não daria conta de oferecer aqui uma resposta muito segura. Afinal, a arte também está mais complexa do que nunca, a tal ponto que ela própria já não tem grandes compromissos com o belo.

Por enquanto, podemos tentar apontar uma direção com um jogo de palavras: fotografia não é arte, vídeo não é arte, computação gráfica não é arte, nem mesmo pintura, por si só, é arte. São apenas técnicas. Mas, é claro, fazemos arte com fotografia, vídeo, computação gráfica, pintura e tudo mais. Talvez a mesma coisa valha para as técnicas de imagens do cosmo, do corpo, dos micro-organismos, e para os fractais: não são arte, mas possamos utilizá-las para esse fim.

Penso que a arte se construa numa boa adequação entre forma e conteúdo. Essas imagens podem se tornar obras estéticas na medida em que os artistas as utilizem para dar materialidade às novas formas de pensar o mundo. De fato, nos anos 90, os artistas foram mais eficientes que os cientistas em utilizar os fractais para representar a nova complexidade que se reconhecia no mundo, com a economia global, os multiculturalismos e a internet. Assim como a fotografia e o cinema, além de produzirem belas tomadas, representaram bem as conquistas de um mundo moderno marcado pela racionalidade, pela velocidade e pela eficiência.

Então, nós que estamos por estas bandas, vamos ver as tais paisagens neuronais. Quem sabe, além de belas, elas permitam dar forma a uma nova compreensão da inteligência. E também das novas redes onde, agora, essa inteligência às vezes se perde, às vezes se expande.

1 comentários:

Platypus disse...

Apophisys é um freeware para criação de fractais, com um grande número possibilidades de configuração. Também é possível exportar as imagens em JPEG. Os resultados são plasticamente incríveis. Não serve pra muita coisa, mas é lúdico brincar com as as formas. Procurem em: http://www.apophysis.org/ .